domingo, 28 de setembro de 2008

Quinta-feira santa

Acordou submissa em plena quinta feira.

Lavou os cabelos e, já que estava debaixo d’água, aproveitou pra depilar a virilha.

Pegou o jornal, mas percebeu que estava sem paciência pra desgraça.

Pensou em ligar pra alguém, mas achou melhor deixar o telefone fora da jogada.

Quando já estava se acostumando ao tédio de seu interminável dia de trabalho, foi avisada que podia ir pra casa mais cedo.

Chegando em casa mais cedo, fez uma macarronada pra dois.

Como não apareceu ninguém, jantou só.

Já que jantou só, dispensou a sobremesa.

Sem companhia, resolveu cuidar da pele.

Passou hipoglós no rosto e desistiu de todo o resto.

Uma pena, pois em dias como esses, poderia facilmente ser dominada.

Mas todo mundo sabe que a todo tempo acontecem casos assim, de submissão em vão...

Foi dormir.

Quem sabe sexta não seria seu dia de sorte?

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Como deve ser

-E aí?
-E aí o que?
-Como foi?
-Como foi o que?
-Ahhhhhhhhhhhhh! Conta....
-Ai, gata, você já quer saber da trepada que dei há menos de 24 horas?
-Claro! Você é a única que me traz novidades nesse aspecto. Todas as minhas outras amigas são casadas e, naturalmente, não fodem como gostariam.
-Ou não gostam de como fodem...
-Você é do mal, guria!
-Nem, mas não resisti à piadinha infame.
-Não resistiu em mudar de assunto, que eu te conheço.
-Ai, preciso mesmo contar?
-Só pra mim, vai.
-Tá bem, o que você quer saber?
-Tudo.
-Pergunta.
-O pau? Satisfatório?
-Sim, um mediano standart.
-Grosso?
-Sim.
-Mesmo?
-Sim, daquele tipo que arde um cadinho quando entra, sabe?
-Hummmmm, delícia...
-De fato.
-Pegada?
-Interessante.
-Como assim?
-Suave com arroubos de intensidade.
-Nossa...
-Foi legal mesmo. Ainda por cima ele curte chupar, sabe?
-Confesso que esqueci o que é isso, Jaime tem nojo.
-Pois é, esse rapaz gosta muito...
-Que beleza, filha! E aí? Marcaram alguma coisa?
-Nem me atrevi a tocar no assunto.
-Como assim? É tão difícil achar um homem que encaixe bem, qual o problema de vocês se verem mais?
-Problema nenhum. Acontece que, se eu sugerir algo, naturalmente ele vai ficar naquela paranóia de que eu quero casar e ter três filhos, começando a produção mês que vem, quando eu parar com a pílula.
-Menina, que horror!
-Querida, os homens estão todos assim e acho que isso é um pouco culpa nossa...
-Como assim, culpa nossa?
-Nossa, das mulheres.
-Quê isso, amiga? Tanta Rose Marie Muraro pra nada...
-Não é isso, deixa eu explicar direito.
-...
-A culpa não é nossa, nossa, mas do papel que passamos a assumir no mundo em menos de 50 anos. Já reparou que estamos dominando? Natural que eles fiquem inseguros e defensivos, é muita mudança pra pouco espaço de tempo, entende?
-Que espaço de tempo o quê! Agora vamos ter que nos diminuir pros homens ficarem mais confortáveis em nos oferecer um sexo meia-boca?
-Se ainda fosse meia-boca, tava valendo, né, lindona?
-Porra, agora você tá nessa, né, nega? Só tripudiando...
-Ai, tô brincando com você, vai! Mas escuta aqui, o Jaime, hein? Que coisa! Eu se fosse você parava de fazer o jantar dele...
-Daí ele ia jantar fora todo dia, mas deixa o Jaime, que ele já tem o que merece.
-Vai dizer que você não chupa ele? Duvido! Você nunca pôde ver pau sem querer logo colocar na boca, ou você acha que eu não lembro do seu apelido dos tempos da facu?
-Pára com isso, que Jaime tá pra chegar!
-Ele devia ser penalizado!
-Tô te falando que ele já tem o que merece...
-O que é? Agora fiquei curiosa...
-Você não vai conseguir mudar de assunto. Quero saber mais do moço.
-Não tem mais nada pra saber.
-Fala.
-Ele fode bem, chupa bem, conversa sobre as coisas da vida depois do sexo e faz um ovo mexido bacana.
-Ovo mexido?
-É, piranha, ovo mexido, sim, com baguete!
-Baguete é fino demais!
-Não o baguete dele...
-Sei.
-Ai, amiga, sinceramente, não quero me apegar.
-Por que?
-Porque não é momento pra isso.
-Eu sei que você tá deslumbradinha com seu sucesso e com a chuva de homem que invadiu sua horta, mas pensa no futuro. Você quer ficar sozinha pra sempre?
-Mas eu não sou sozinha, eu tenho meus amigos, tenho meus amantes. Tenho também meus amigos-amantes.
-Sim, mas isso não aquece seu coração...
-Que mané coração aquecido o que!? Toda vez que me envolvo com alguém, fico dispersa, esperando telefone tocar, email chegar, menstruação chegar. É um stress, uma leseira, que me canso só de pensar.
-Você quem sabe...
-Pra que ter homem fixo? Pra ele parar de me comer, que nem Jaime fez com você?
-Fala baixo que ele tá pra chegar! E não exagera que também não é assim...
-Claro que é, querida, você vive triste, cercada de vibradores.
-É bom ter vibrador, vai.
-Claro que é, mas, por exemplo, o meu, tá cheio de poeira, há tempos que não preciso dele.
-Você tá numa boa fase, só isso.
-Eu sou dona das minhas fases, é diferente.
-Quero ver você dizer isso daqui a dez anos...
-Daqui a dez anos o mundo já deu muita volta. Não vou ficar parada esperando a liberdade sexual terminar de ser trancafiada e minha bunda definitivamente ceder à gravidade.
-Dramática...
-Nasci atriz, bela.

Depois de tão edificante conversa, uma foi prum encontro e a outra pra cozinha, cortar cebola pra salada do maridão. Ambas certas e erradas.

São até capazes de se ferir, mas nunca de se desrespeitar.

Sabem que estarão ali toda vez que a outra precisar, independente de quantos homens ou vibradores ocuparem suas camas, sofás e cozinhas.

Simplesmente amigas.

Como deve ser.

sábado, 6 de setembro de 2008

A conta

-Oi, Ana, quanto tempo!
-Oi, Debica, tudo bem?
-Sim, querida, você sumiu...
-Pois é...
-A última vez que te vi você tava traçando o cara mais lindo da festa.
-Nem me fale...
-Tá rolando? Vocês têm saído?
-Aconteceu uma parada surreal.
-O quê?
-Aquele dia a gente tava no maior romance, você viu né?
-Se vi! Você tava despertando a ira feminina no banheiro.
-Como assim?
-Tinham umas meninas falando de vocês.
-Falando o quê?
-Coisa de mina invejosa, que o moreno de blusa branca estava agarrando uma gorda descabelada.
-Gorda é sacanagem! Com tanta caminhada e pilates, vagabundo me chamando de gorda!
-Raiva, filha! Você bem sabe que não é gorda!
-Pra esses padrões zero cal, eu sou gorda, mas pros homens, acho que dou pro gasto.
-Modesta! Você é a maior pegadora que eu conheço!
-Também não é assim, vai. De repente um ou outro finge que me acha gostosa, vai saber.
-Homem não finge, baby, homem fica de pau duro!
-Pode crer!
-Mas conta do bofe! Quero saber.
-Cara, a parada que rolou foi meio bizarra.
-Como assim?
-A gente foi prum motelzinho meio de quinta, aquele esquema...
-Sim, normal também, né? Não dá pra exigir vista pro mar...
-Pois então, a noite foi ótima, ele me comeu umas 3 vezes. Bem disposto o rapaz, super carinhoso e tal.
-Onde tá a parada bizarra?
-De manhã acordei e ele não tava no quarto.
-Hummm, que péssimo.
-Pensei: “ah, ele deve ter horário, não quis me acordar”.
-No domingo?
-Pois é, mas o pior ainda estava por vir.
-Ai meu Deus...
-Ele foi embora e não pagou a conta. Quando desci, tive que pagar tudo, o visa electron tava fora do ar, eu tava sem cheque, fiquei contando moeda na recepção da espelunca, você acredita numa coisa dessas?
-Gente, que bizonho! Mas como que no motel deixaram ele ir embora sem te avisar?
-Foi o que perguntei e sabe o que eles me responderam?
-O quê?
-Que o cara tinha pedido pra me deixar dormindo, já que tinha deixado a grana comigo.
-Que cara de pau!
-Desde então fiquei meio ressabiada de dar de primeira pra quem eu não conheço.
-Ai, amiga, nem sei o que te dizer.
-Se duvidar, nem minha terapeuta vai saber!
-Mas também, esquece isso, vai, senão você vai ficar paranóica.
-É, tô tentando, mas de vez em quando me volta a cena deu contando moeda de um real com aquele povo olhando pra minha cara com olhar de pena, sabe assim?
-Bizarro, mas, ó, desanima não. Sabe quem perguntou de você?
-Quem?
-Alexandre.
-O moreninho bocudo?
-Esse mesmo.
-Hummm, delícia.
-Pois é. E esse você pode ter certeza que não vai regular a mixaria.
-Hahahahahahha.
-Isso, filha, tem que rir dessa situação, pra ela ir embora de vez.
-Total!

Ninguém precisava dizer, mas ambas sabiam que contar moeda na porta do cinema, nas lojas americanas ou na padaria é bem diferente de fazê-lo na recepção de uma espeluncazinha qualquer, sob o olhar de reprovação dos moralistas de plantão.

Por conta desse episódio, Ana agora só quer saber de dar pra homem rico.

Dali em diante, pra ela, passa a valer a máxima de quem dá aos pobres, invariavelmente, acaba tendo que pagar o motel.