quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Para Cazuza (ou o nosso humor a gente inventa) – pro Clube da Leitura


Outro dia me disseram que meu computador não tinha memória, tinha vaga lembrança. Disseram também que a história é filha do tempo e que filhote de gato nascido no forno não é biscoito, é gato. Tentei juntar todas essas informações no intuito de estabelecer uma espécie de linha lógica que uniria os fatos às opiniões e descobri que esse negócio de subjetividade é uma faca de dois legumes apontada pra cara dos reality shows que, de tanto foderem com a nossa vida, acabaram nos engravidando das celebridades geneticamente modificadas.

Interessante que, por mera prática profissional, acabo de reler o parágrafo acima e imediatamente penso que se o mesmo tivesse sido escrito por outra pessoa eu seria a primeira a perguntá-la o que ela teria consumido em termos de psicoativos estupefacientes. Mas como a autora sou eu e sei que só tomei café com mel, penso que talvez minha mente esteja precisando se libertar das amarras da prudência, afinal, como diria uma velha amiga, a vida é muito curta pra ficar removendo pendrive com segurança. Falando em pendrive, bem que podiam inventar um à prova de informações desnecessárias. Já pensou que onda? Você insere o bichinho no computador e ele separa o que vale a pena ser guardado do que já nasceu com cara de abortado. Minhas prioridades, por exemplo, seriam eliminadas de cara, posto que prosa e verso, mesmo sendo coisas muito bonitas, são bastante abstratas sob o ponto de vista prático do contra-cheque.

Chocado, leitor? Não fique. Tem uma coisa a meu respeito que ainda não te disse: quero salvar o humor da coleira da stand up comedy. Taí, sem perceber, criei um movimento de suma importância. De agora em diante, vou lutar pelo direito da livre movimentação das comédias. Veja bem, não quero proibir que elas fiquem de pé, mas permitir que elas não sintam culpa de ficar de quatro para serem comidas pelo tempo e lambidas pelo cinismo. Pra quem não sabe, o tempo, quando penetra numa comédia, é capaz de loucuras metalinguísticas de amplo alcance, enquanto que o cinismo, com sua língua afiada, aproveita para lhe contar segredos de liquidificador capazes de fazer qualquer arrepio nadar contra a corrente só pra se exercitar.

Promovido o ménage entre o tempo, a comédia e o cinismo, os caminhos se abrirão e chegaremos ao dia em que alegrias serão vendidas a preço de custo, separadas, naturalmente, por graus de ação e riscos à saúde. Na prateleira desta farmácia conceitual do futuro, os risos estarão dispostos em três cores de tarjas: amarela para os genéricos, mais conhecidos como politicamente corretos, indicados nos casos de tédio. Vermelha para os de ação aguda, mais conhecidos como levanta-defunto, indicados nos casos de desesperança. E, finalmente, a preta, para os que agem diretamente no sistema nervoso central, mais conhecidos como bolinhas, indicados nos casos de apatia seguida de falta de banho.

Depois dessa revolução estético-biológica, não haverá mais razão para suicídios e nem para as demais ações promovidas pelo desespero. Habitaremos um mundo onde o humor será a peça mais visitada nos museus de grandes novidades, voltando a ser aquilo que sempre foi: uma arma de fazer gemer os engraçadinhos mais céticos.

Ou ceticuzinhos.

Um comentário:

4Ventos disse...

Muito Bom, quero um tarja preta!