terça-feira, 13 de janeiro de 2009

O feng shui de Jane

Essa coisa de ano novo vida nova é uma balela que, mal ou bem, acabamos comprando junto com o peru, as nozes, as uvas e as calcinhas vermelhas. Com Jane não foi diferente: parou de fumar, começou a beber de forma careta e resolveu cuidar mais do que bota pra dentro, seja a comida propriamente dita ou as pessoas do sexo oposto.

Dessa forma, sem falar nada pra ninguém, começou 2009 analisando os passos dos moços que a assediaram em 2008, desde os que lograram êxito até os que ficaram na mão, seja por falta de oportunidade ou por pura inabilidade. Tudo sem mágoa e com afeto, porque, afinal de contas, as pessoas são o que são e dão o que tem.

A coisa está sendo tão eficiente que, pelas suas contas, até dia 20 de janeiro terá anunciado seu veredicto: quem fica e quem sai de sua lista de afetos e quem pode algum dia ganhar seu coração.

Olhando assim, parece até que Jane está à busca de um Tarzan, mas que nada. A única coisa que deseja é um cara que beije dignamente, que saiba onde botar as mãos, que chupe buceta sem ter que ser requisitado para tal e que não tenha medo de intimidade, nem tampouco de andar de mãos dadas. Porque a era dos hermetismos angustiados, pra ela, já acabou. Chega de homem que só é afetuoso quando quer algo em troca. Chega de gente que tem namorada, ou casos, ou rabos presos. Chega também dessa coisa de não estar a fim de se abrir, nem de falar sobre este ou aquele assunto. Porque, cá pra nós, melindre e mau humor são tão cafonas quanto calças semi-bag.

E assim, decidida como um centro-avante, foi ticando sua lista sem alarde. Tanta terapia tinha servido para fazê-la perceber que somente quando nos livramos de velhos hábitos é que podemos abrir espaço pro novo. Só mesmo esvaziados é que observamos com entusiasmo o que está ainda por vir. Na realidade, esse exercício nada mais é do que uma arrumação interna, uma reorganização de interesses, uma espécie feng shui sentimental. Ou bucetal, como queiram.

E, do jeito que a coisa vai, é capaz de no carnaval a moça já estar namorando.

Porque, afinal de contas, quem não chora não mama.

domingo, 4 de janeiro de 2009

O croissant de cada dia

Anita foi morar com o namorado. Pra ela, isso não é casar. Mas sua mãe, que já está no sexto marido, sabia que aquilo ali era casamento, sim. Só não insistia no assunto, pra não assustar a própria cria.

-Oi, Mami.
-Oi, filhota, já ia te ligar, tô com saudade!
-Eu também.
-Como vão as coisas em casa?
-Tudo bem, tô adorando morar com o Alyson, ele é fofo, vai à feira todo domingo e sempre traz cuzcuz e flores.

Aquilo pro ouvido de uma mãe soava mais retumbante do que o Concerto número um para piano e orquestra de Tchaikovsky.

-Mas, maezinha, aconteceu uma coisa que eu queria te contar.

Sempre que ouvia maezinha dito com aquela voz de ambrosia, sentia um calafrio na espinha. Mas, na dúvida, se fez de moderna:

-Conta.
-Aly conseguiu uma bolsa pra estudar em Paris.
-Que maravilha! Aquela que ele vem há anos tentando?
-Essa mesmo, em bioestética!
-Que beleza, filha, precisamos comemorar!
-Sim, claro.
-Ele quer te levar com ele, né?
-Isso.
-E você vai, claro!
-Pois é mãe, não sei se devo tomar uma atitude tão drástica. E se lá não tiver trabalho pra mim?
-Como não? Ele não tem cidadania francesa?
-Tem.
-É só vocês oficializarem a união que vai dar tudo certo!
-E você não vai morrer de saudade de mim?
-Vou, querida, claro, mas é a lei natural da vida.

Era a tal coisa: sabia que a filha tava feliz. Por mais que doesse, era necessário. Só tinha mesmo que convencer a garota de que ela já estava casada há um tempo. Sentiu que aquele telefonema seria esclarecedor.

-O lance é que a gente não é casado, né, mami!
-Eu não afirmaria isso com tanta certeza...
-A gente mora junto, é muito diferente.
-Diferente como?
-Ah, a nossa conta do banco não é conjunta, por exemplo.
-Mas você não tem seu dinheiro? Por que seria conjunta?
-Porque demonstra confiança.
-Pode até demonstrar, mas não é coisa pra se pensar agora, vocês estão juntos há o quê, quatro anos? É cedo pra conta conjunta, deixa isso pra depois.
-Tá, mas eu não tenho certeza se ele quer que eu tenha o sobrenome dele.
-Ok, se você não quiser também, nem precisa...
-Mas e se eu quiser?
-Aí vocês vão dar um jeito, filha, escuta sua mãe, que de casamento eu entendo...
-Hahahahahahahahah!
-Você tá se prendendo a detalhes. A vida é feita de fatos concretos.
-Explica com exemplos.

Desde pequena, Anita pedia pra mãe explicar as coisas com exemplos. Sempre foi uma tática muito boa entre elas, mas ao mesmo tempo era uma dinâmica delicada, porque exemplo é coisa que marca os filhos por toda a vida. Baseado nisso, buscou ser o mais direta possível.

-Tá, então vamos lá: sempre que ele quer, vocês transam?
-Não, nem sempre. Às vezes ele não tá a fim; às vezes sou eu.
-Ok, tudo certo, mas você não deixa ele na mão durante muito tempo, né? Nós sabemos como são os homens, dão logo um jeito de se arranjar fora de casa e isso não é bom, concorda?
-Mamita, me poupe!
-Vai dizer que depois de uns dias sem vontade de abrir as pernas você não tem que dar uma chupadinha paliativa?
-Mãe!
-Responde sua mãe ao invés de dar uma de virgem dos lábios de mel!
-Chupadinha paliativa à espanhola, se é isso que você quer saber!

Teve o impulso de soltar “Essa é minha garota!”, mas se conteve. Sempre foi liberal, mas de poucos elogios. Achava isso bom pra forjar o caráter. O fato é que não cabia em si de tanto orgulho. Sabia que tinha que vir com a cartada final. Respirou fundo e meteu:

-Chupadinha paliativa é coisa de mulher casada, filha. Porque demonstra não só confiança, mas também companheirismo. Indica que você, mesmo nas horas que não está muito a fim, se esforça pra agradar seu homem, que, com certeza, faz o mesmo por você. Porque homem que volta da feira com cuzcuz e flores, sabe cuidar de uma dama.

-Nossa, mamita, me senti esposa agora!
-Maravilha! Sigamos então para os assuntos práticos: quando que começa a bolsa dele?
-Só em setembro.
-Acha que tá longe? Fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto. Sete meses, porque setembro não conta, que já é a viagem. Sabe que isso não é nada pra organizar uma festa, né?
-Festa, mãe?
-Bem, isso é com vocês, mas acho que tem que ter uma festa, que já fica como casamento e despedida, afinal serão pelo menos quatro anos fora, né?
-Isso é! Só tenho que conversar com Aly primeiro.
-Claro, mas tem que ser logo, que o tempo voa!

Assim, dois dias antes de partirem pra Paris, passaram uma linda tarde de calor na casa de um amigo em comum, com direito a piscina, cerveja geladérrima, churrasco e making off. Tudo isso pra aquecer o frio vindouro.

E também, é lógico, pra abrir o apetite pro croissant de cada dia.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Pequenina da pernoca grossa

Ontem vi essa foto no orkut de uma amiga e pirei: eu sou a branquela do meio, a magrela da pernoca grossa e, junto com as outras meninas de maiô vermelho, integrava a equipe feminina de natação do América Futebol Clube. Apesar de parecer fragilzinha, eu nadava borboleta, treinava todo santo dia, competia nos finais de semana e não tinha nada que se assemelhasse a uma vida social. O que era até bom, já que, sem peito nem bunda nem pentelho, não era mesmo convidada pra quase nenhuma farra da galera da escola. E, quando por alguma eventualidade, acabava indo parar numa festinha, me sentia sempre inadequada, mal-vestida ou as duas coisas. Diversão pra mim era estudar e escrever no diário. Mas o que mantinha mesmo minha sanidade era treinar. Se o dia tinha sido duro na escola, caía na piscina e nadava ainda melhor. Assim, nunca se abateu sobre mim a sensação de completa infelicidade. O bom da natação era que dava pra chorar durante o treino todinho sem que ninguém reparasse. Nem Silvio, meu técnico e fã declarado, conseguia sacar. E olha que ele foi o primeiro homem a me observar ostensivamente. Apesar das piadas sem graça que costumava contar pra nos distrair, sabia ser duro e impor respeito sem precisar levantar a voz nem fazer grosseria. Pelo contrário, quando tava puto, falava até mais baixo. Hoje vejo o quanto ele foi o grande responsável pelo fato deu nunca ter sentido pena de mim mesma. Não por me favorecer em detrimento das outras atletas (coisa que ele não queria e nem podia fazer), mas por levar fé em mim e na minha coragem de ter medo. Num determinado dia, porém, eu, muito de saco cheio dessa vida de treinamentos, resolvi que era a hora de desertar:

-Não dá mais, cansei de contar ladrilho. Quero ter tempo pra ler um livro, pra ir ao cinema, pra não fazer nada.

Deu pra ver o castanho da decepção naqueles olhos. Pela primeira vez percebi o quanto eu era uma promessa que se partia em pedaços. Parecia o fim de um namoro. E, guardadas as devidas proporções, era mesmo. Incrédulo, ele ainda tentou me dissuadir:

-Nós plantamos tanta coisa e justamente agora, na hora de colher o fruto do trabalho, você cai fora. Tem noção de que ano que vem é quando você tem chance de bater os índices mais importantes?

Fui, sem dúvida, uma decepção na vida dele, mas não tinha realmente mais saco. Queria desbravar outros mares, já que tinha perdido o medo de me afogar.

Anos depois, nos encontramos no parque aquático Júlio De Lamare, quando eu já era estudante de Educação Física da UERJ. Lembro que minha espinha gelou de medo dele me achar fora de forma e decadente. Devo ter feito uma cara de tanto pavor que ele, elegantemente, me tranqüilizou:

-Que nada, você ficou uma moça tão bonita! Eu sempre soube que isso ia acontecer, mesmo quando você ainda era aquela magrelinha descabelada.

Sílvio sempre teve essa capacidade de me botar pra cima, de me fazer sentir importante. Uma vez, num dos treinos que tínhamos às 7 da matina de domingo, ele disse que não esperava que nós seguíssemos com o esporte na vida adulta, porque era realmente complicado conciliar os treinos com trabalho e estudos. Mas esperava, sim, que aquela experiência de disciplina e de esforço nos marcasse por toda a vida, nos nossos objetivos futuros. Estava mais preocupado em formar pessoas do que atletas. Acho que no fundo foi pelo Sílvio que fui estudar Educação Física, por saber que foi o esporte que me tirou das trevas da exclusão e me catapultou pruma vida inteira de busca pela superação. Hoje acho que não cruzo nem 25 metros de borboleta, mas sei que, ainda assim, posso ir onde eu quiser. E essa certeza quem ajudou a plantar em mim foi ele.

Olhando a foto de novo, vejo que eu nem era tão feia assim como me achava. Na real, era até engraçadinha. Pensando bem, bobos dos meninos que não me davam bola na escola e das meninas que não me convidavam pras festinhas. Perderam, porque nessa época eu já era eu. Tanto que já morava em mim a esperança de ser feliz, de ser amada, de botar o bloco na rua e de ligar o foda-se. Ali, naquela magrela sem pentelho, já habitava a artista em que me transformei. Nem eu mesma consigo acreditar que dentro daquele maiô largo já pulsava um imenso amor pelas palavras e uma vontade delirante de contar histórias.

Silvio nem sabe que não trabalho com educação física desde que me formei, que virei cineasta, que tenho hérnia de disco, que faço pilates, que amo caminhar, que nado na praia sempre que posso e que tenho pavor de cheiro de cloro. Vai ver nem se lembra mais de mim. Mas eu nunca vou me esquecer dele e de seu bigodinho à la Rodolfo Valentino. Hoje sei que mora na Alemanha, é casado e tem pelo menos um filho.

Aposto que aprendeu a fazer piadas sem graça também em alemão, que volta e meia tira uma magrela das trevas da exclusão, que come strudell todo dia e que nem faz idéia da saudade que sinto dele.



sábado, 6 de dezembro de 2008

A cereja do sundae

Fabrícia não curte tomar a iniciativa. Mais por autopreservação do que por machismo, diga-se de passagem:

-Mulheres muito cheias de opinião não devem partir pra dentro. Melhor deixar essa tarefa pras mais quietinhas...

Como todo vaticínio tem sempre uma exceção, nesse caso não podia ser diferente:

-Às vezes, mesmo sem querer, acabo ouvindo a voz da minha buceta.

Fabrícia enche a boca pra falar de buceta. Nada de xereca, vagina, perseguida, vulva, xana, flor do lácio, piriquita, boca de cabelo, perereca, xoxota. Pra ela buceta é e sempre será uma palavra de lirismo rústico. Uma poesia, por si só, concreta.

Pois bem. Dia desses, na internet, encontrou um amiguinho virtual que costuma vez por outra acompanhá-la em aulas noturnas de intra-aeróbica de alto impacto e longa duração, seguidas de repouso e café da manhã, exatamente nessa ordem.

-Ele apresenta uma boa performance e, diferentemente dos outros, não se importa com minhas constantes viagens. Pelo menos é o que me diz...

Baseada nessa lógica, chamou o moço prum encontro. Antes tivesse ficado quieta, pra não ter que ouvir a resposta mais desagradável que existe:

-Poxa, estou super ocupado, tenho uma prova sinistra daqui a um mês e não quero me desfocar.

Na hora ficou puta. Fala sério que o bofe vai ficar um mês sem! Se ela não fica, imagina ele! Na hora mandou um: “Vá tomar no cu que vou acreditar nessa sua lorota! Por que não me diz logo que não está interessado? Seria mais honesto de sua parte!”.

Diante de tão inflamada reação, o mancebo sugeriu uma opção B:

-Podemos dar uma rapidinha no almoço ou no final de semana, depois que eu terminar de estudar...

Como rapidinha entende-se dizer oi, fuder e dizer tchau, tais como máquinas mortíferas, sem ninguém ter que morrer depois, naturalmente. Aquilo para Fabrícia era o fim. Apesar de falar um monte de baixaria, fazer um monte de baixaria, ser assinante de um guia de motéis e curtir um pompouarismo básico, nunca conseguiu fazer a linha biscate:

-Quê isso! Vou fingir que não entendi a proposta!

Mas, apesar da aparente aridez afetiva, o menino é até gente boa, bem-humorado, com potencial para virar um personal fucker satisfatório no futuro, desses que te atendem uma vez por semana sem regular a mixaria. Do jeito que a coisa anda, mais vale um personal na mão do que um protótipo de namorado confuso voando. Tudo bem que existe o risco de envolvimento. Mas vida sem risco não é vida, é plano de saúde sem carência.

O fato é que Fabrícia sabe, por experiência própria, que quando os pequenos lábios falam, todo o resto se cala. Pensando nisso, resolveu manter o charme e fingir que não era com ela. Pescou no celular as chamadas não-atendidas mais interessantes e seguiu com seus freelas. Não sem antes, é claro, dar aquela alfinetadinha básica:

-Quero ver se essas biscateiras que vão se sujeitar a isso são tão tesudas como eu...

A bicha, além de vaidosa e tinhosa, sabia que, a seu modo, exercia um poder qualquer sobre aquele pau, da mesma forma que aquele pau batia-lhe o sino pequenino. Sabia também que ser mulher significava, entre outras coisas, entender que tudo nessa vida passa, inclusive cenas de bucetismo explícito em ambiente afetivo aparentemente árido.

O importante, no final das contas, era manter-se em cima do salto, porque somente do alto podemos ver melhor todas as possibilidades.

E, em tempos como os nossos, de indiferença crônica e generalizada, uma boa carta de clientes pode fazer toda a diferença.

Como a cereja faz no sundae.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

As testemunhas

Perguntada em uma coletiva do porquê fazer cinema, Cecília, curta-metragista de longa data, sem o menor constrangimento, disse:

-É pra conhecer meninos de outras partes do país quando viajo pelos festivais com meus filmes.

Diante do silêncio acachapante, resolveu complementar:

-Mas também estou aberta a meninos que moram no meu próprio Estado, naturalmente.

Como ninguém dizia nada e só o que se via eram olhares lânguidos, resolveu adotar uma postura mais globalizada:

-Meninos do mundo inteiro, ok? Não tenho preconceito de raça, cor ou credo. Quem me conhece, sabe do que falo.

Mesmo quem não a conhecia, sabia que dizia a verdade. Festival de cinema é legal pra rever velhos amigos, passear, fazer novos amigos e, por que não dizer, realizar intercâmbios sexuais. No meio disso tudo, é claro, existem as sessões, as oficinas, os debates. Importantíssimos, diga-se de passagem. Mas tudo, tudo que é feito, tem como objetivo final o bar, a biritolândia, as discussões inflamadas, as opiniões divergentes, o brinde ao cinema nacional, ao cinema estrangeiro, à vida, à cachaça, num caminho sem volta rumo às festinhas privês nos quartos dos hotéis e aos banhos de piscina com ou sem roupa, à escolha do cliente. Resumindo: quem nunca se deu bem num festival, ou não tentou, ou simplesmente não estava interessado.

Só que Cecília não precisava explanar todos os curta-metragistas. Inclusive porque muita gente vai pra essas viagens acompanhado, numas de curtir uma luazinha-de-mel fora de época, tipo micareta intra-aeróbica, pra dar aquela chacoalhada na relação.

O fato foi que a moça falou demais. Podia ter dito somente que o importante era o intercâmbio e pronto, já estaria subentendido ao que se referia. Mas agora, com o milk-shake derramado no meio da sala de imprensa, só restava uma coisa a fazer: apelar pro exotismo comportamental corriqueiramente atribuído a artistas como ela.

-Gente, vocês acham mesmo que estou falando sério? Eu sou uma mulher comprometida. Além de namorado, tenho quatro cunhadas, sabem lá o que é isso?

O pessoal sabia. Aliás, jornalista, de uma maneira geral, contrai matrimônio e constrói, desde muito cedo (na maior parte das vezes ainda dentro da escola de Comunicação), a idéia de que o pessoal de cinema é tudo louco depravado sempre pronto pruma suruba. Assim, quando uma cineasta fala de laços afetivos estáveis, mesmo após declarações iniciais duvidosas, a comoção é grande.

Sentindo que sua tacada tinha sido certeira, aproveitou pra arrematar com chave de ouro:

-Aliás, a gente vai demorar muito? Preciso saber se meu gatinho vai poder me buscar no aeroporto amanhã, combinei de ligar pra ele daqui a pouco. Mas antes vamos concluir a pergunta, que é melhor pra todo mundo. Vocês querem saber por que faço cinema, não é isso? Olha, a princípio pra expressar minha visão de mundo e, depois, pra discuti-la em fóruns privilegiados, como nos debates desse festival ou mesmo em coletivas edificantes como essa.

Pronto. Ficou o dito pelo não-dito.

Até mesmo porque estava quente, tinha festa na beira da piscina e a noite prometia emoções subaquáticas das boas.

E é sabido que, em meio líquido, as únicas testemunhas sólidas são as osculares.





sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Dia de musa

A internet tem coisas que até a internet duvida. Como Fábio, um jornalista que um dia veio aqui no blog e ficou amarradão. Não deu um mês e a gente já tava mostrando textos um pro outro, não só os nossos, mas os de outras pessoas também. Assim, naturalmente, começamos a conversar sobre as coisas da vida, entendendo-se como coisas da vida o sexo, o trabalho e as relações inter-pessoais, exatamente nessa ordem. A real é que o Fábio mora em Blumenau e nos falamos volta e meia pelo msn. Nos escutamos e tecemos comentários. Somos meio que consultores para assuntos do sexo oposto um do outro e, uma das coisas que eu sempre disse é que todo garoto novo que nem ele, com vinte e poucos anos, merece ser comido por uma mulher mais velha, de trinta e tal, que nem eu. Minha tese gira em torno do fato de que a vantagem dos homens mais novos é a carga de neurose reduzida. Já a das mulheres mais velhas, é aliar o fetiche da balzaca à possibilidade de algo além do sexo burocrático e das conversas pra boi dormir. Mas, pra isso, há de se ter coragem, porque dá medo encarar um mulherão que já teve vários machos antes. Explico que, nesse tipo de relação, a linha do tempo, uma hora ou outra, se mostra implacável. É mais ou menos assim: enquanto o garoto batia sua primeira punhetinha e o máximo que fazia era arrasar no recreio, a mulher já esbanjava na prorrogação, fazendo (e levando) gol atrás de gol. Fábio acha legal meu discurso, apóia minha preferência, acha até que seria bom seguir meu conselho e arrumar um mulherão assim, mas ele não curte, fazer o quê? Ele gosta de garotinhas. E ponto final.
Acontece que o rapaz é escritor e já vinha me dizendo que tava bolando uns contos em que eu seria uma das personagens. Daí ontem me veio com esse texto. Além de alegrar meu dia (que chato ser musa...), ele escreveu pra todas as mulheres fortes e pra todos os garotos novos que as admiram. Um texto sobre encantamento, nudez e fetiche. Para comer com os olhos.

Sirvam-se à vontade:
http://fabioricardo.wordpress.com/2008/10/30/o-principe-encantado-ou-nao/

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Anônimos

-Como assim colocar o despertador pra meia hora antes só pra dar uma rapidinha?
-Ué, não é todo dia que podemos ir trabalhar tão relaxados, não é mesmo?
-Cara, mas isso eu nunca vi, sinceramente.
-Bem-vinda ao mundo dos tarados anônimos!
-Hahahahahahaha.
-Se eu der mole, rola até videozinho, esquema fetiche.
-Vem cá, ele é tarado, mas é normal, né?
-Sim, ele é um cara que marca as paradas e comparece com animação, não tem nada de errado nisso, tem?
-Claro que não, mas vocês tipo conversam?
-Lógico, né? De vez em quando ele reclama das minhas unhadas e me chama de mulherzinha.
-Não tô falando desse tipo de conversa!
-Tá falando do quê, então? Astrologia? Culinária? Crise mundial?
-Não! Mas por exemplo, esse lance do despertador, foi uma coisa conversada?
-Foi, porque da outra vez ele já tinha mandado essa, que a gente podia ter acordado uns 20 minutos mais cedo, que era o tempo contado pruma rapidinha básica.
-Caralho, ele é metódico!
-Parece que sim.
-Parece?
-É, ele é metódico.
-Quem diria, você comendo um metódico, logo você, que só anda com os caóticos!
-Pô, mas eu não tenho nada contra o método.
-Tô vendo...E a rapidinha, é boa?
-Sim. Incrível como realmente chego no trabalho mais relaxada...
-Que coisa, hein!
-É.
-Vem cá, você não tá de 4 por esse moço não, né?
-Olha, sempre que encontro com ele fico de 4.
-Hahahahahahaha.
-É inevitável: ele manda, eu obedeço.
-Jesus amado...
-Ah, uma submissãozinha de leve não faz mal a ninguém, vai! Depois é só virar o jogo, que nem no judô.
-Por isso as manchas roxas!
-Exatamente. Olha, amiga, tenho que ir pro pilates, mas a gente se fala, tá?
-Beleza, bora marcar o bota-dentro do apê da Lia, ela descolou um cantinho lindo no Flamengo.
-Bora! Só marcar e me avisar. Ando arrasando quando o assunto é botar dentro...
-Lasciva!

Nem era hora do pilates, mas aquele papo tava começando a dar nervoso. Não tava a fim de entrar em maiores detalhes, porque conselho de amiga é até legal, mas nesse caso, o melhor era botar o bloco na rua.

Até mesmo porque atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu.