segunda-feira, 10 de março de 2008

A lista de Cindy

Cindy resolveu listar as características que mais a atraem no sexo oposto, pois acabara de completar 38 anos e seus óvulos não estavam ficando mais jovens. Para tanto, pediu ajuda à sua amiga Ângela, casada há mais de mil anos com o mesmo homem e mãe de três lindas crianças.

- Se disser que vai me ligar no dia seguinte, tem que cumprir com o combinado!
- Justo!
- Não dá pra ser mais baixo que eu, nem mais pobre, nem mais burro.
- Que mais?
- Não pode falar “menas”, nem “pra mim fazer” e nem dizer que “vai estar me ligando”.
- Sim, claro!
- Também não pode feder, já que sou toda cheirosinha e alérgica.
- Lógico, né, Cindy!
- Melhor que não fume, não seja artista, não tenha filhos e more na Zona Sul. Agora, se não morar, tem que ter carro, porque não tenho mais idade pra pegar trem!
- É, você no trem realmente seria um espetáculo à parte...
- Ainda não acabou: não gosto de homem que olha pros peitos das minhas amigas e que fica falando das ex-namoradas!
- Tá certo, Cinderela...
- Posso continuar ou você vai ficar debochando?
- Fala!
- Não curto barrigão de chopp e nem peito super cabeludo.
- Alguma observação em relação à idade?
- Que tenha menos de 50, porque senão vai ser avô do meu filho ao invés de pai!
- Acabou?
- Prefiro que não seja alcóolatra e que saiba falar através de metáforas.
- Metáforas?
- É claro, Ângela! Uma metáfora bem feita é capaz de me tirar da adstringência!
- Aí fica complicado, querida. Olha, já tô em cima da hora pra pegar as crianças, senão levo advertência da escola, é mole? Mas acho melhor você repensar suas exigências, porque a coisa tá preta!

Para não ficar pensando muito em coisas que provavelmente não vão mudar de jeito nenhum, pegou uma revista feminina e topou justo com uma reportagem sobre as agruras vividas pelas fêmeas solitárias que, discreta e desesperadamente, saíam às ruas à procura de um varão que não fosse gay e que não tivesse namorada. As dicas para o desencalhe eram a parte mais assustadora, como se freqüentar supermercados pela madrugada, elaborar perfis em sites de encontros e entrar pro jiu-jitsu fossem as coisas mais naturais na vida de uma mulher. Ao terminar sua leitura, as palavras de Ângela ecoavam como um terrível vaticíno: a coisa estava realmente preta!

Percebeu, então, estar diante de uma encruzilhada existencial: ou continuava sendo exigente e, portanto, incapaz de dispensar uma boa metáfora vinda de um peito moderadamente cabeludo e jovem, ou disfarçava sua insatisfação em meia dúzia de sorrisos triviais e fingia achar perfeito aquilo que não lhe agradava de todo, engrossando o coro das mulheres sem-critério que resvalavam na felicidade como tiros que saem pelas culatras.

Já que a situação era aquela, achou melhor sentar-se debaixo da árvore do tempo, para aproveitar a grandeza de sua sombra e a firmeza de seu tronco. Quem sabe assim, tranqüila e desavisada, não lhe caía uma fruta da estação bem suculenta aos pés?

Pensou nisso e, finalmente, relaxou.

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